Consumo: A cruel supremacia dos tintos


O Brasil é um país tropical. Portanto, há um consumo maciço de brancos, rosés e espumantes, certo? Errado!!!

Infelizmente, este é o país dos tintos. Não que eu desdenhe deles, mas abrir mão da diversidade que só o vinho pode proporcionar, parece-me uma privação sem sentido.

Tecnicamente, os brancos são muito mais gastronômicos por não apresentarem taninos, que são potencializados com o sal e acidez das comidas. Queijos também são verdadeiras armadilhas para os tintos. Além disso, quando se fala em pratos leves, ou também, peixes e frutos do mar, os brancos são imbatíveis. Nós sommeliers, até tentamos dizer que existem tintos para estes casos, mas no fundo, não passam de sugestões paliativas.

Na minha opinião, existem dois fatores principais para este comportamento. O primeiro, é a total falta de conhecimento enogastronômico das pessoas, sempre escolhendo vinhos tintos evidentemente, não importando o que se vai comer. É como se o vinho tivesse um sabor independente da comida. O outro fator absurdo é o clima. Como as pessoas só pensam em tintos, é natural associá-los ao clima frio. Então fica sacramentado, em dias quentes não se toma vinho.

Cabe neste post, uma cena de restaurante que aconteceu em meu serviço. O cliente tinha solicitado um espumante previamente para receber amigos que chegariam logo em seguida. Preparei o espumante, as taças, só esperando a ordem para começar. De repente, ele me chamou e disse: acho melhor nós suspendermos o espumante, pois hoje está muito frio. De imediato, argumentei: acho que devemos manter o espumante, pois nada melhor para brindar e iniciar o jantar. Quanto ao frio, não se preocupe. Se este fosse o problema, ninguém tomaria champagne na região homônima. Ele sorriu e felizmente concordou.

Pizza Margherita: sintonia com brancos

A foto acima é um bom começo para novas atitudes. Agora nas noites de verão, que tal uma pizza margherita harmonizada com um belo Sauvignon Blanc do Novo Mundo. Pode ser um chileno, argentino, sul-africano e claro, um neozelandês.

Esqueçam a cor e pensem nos elementos de harmonização. A escolha de um Sauvignon do Novo Mundo é mais adequada devido ao vinho ser mais encorpado, mais aromático e mais macio, que exemplares do Velho Mundo, notadamente Pouilly-Fumé ou Sancerre. O queijo derretido (subentende-se gordura derretida) tem resposta imediata da acidez do vinho. Neste caso, os taninos de um tinto não têm muita função. O corpo e a força aromática de um moderno Sauvignon respondem à altura o impacto gustativo da pizza. O coroamento da harmonização fica por conta da sinergia do conjunto. Os tomates  e o manjericão casam-se perfeitamente com os aromas herbáceos e de frutas tropicais de um autêntico Sauvignon Blanc moderno.

Coragem e bon appétit!

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4 Respostas to “Consumo: A cruel supremacia dos tintos”

  1. juan rodríguez Says:

    Nelson,como sempre, um comentario inteligente. Mas quero te dizer que o vinho branco começa a se fazer presente nas mesas brasileiras com muito mais intensidade. “culpa” dos importadores, que começaram a trazer brancos de melhor qualidade. Aqui na Peninsula, um branco é o quarto vinho mais vendido. Dá o que pensar, não? Um grande abraço e feliz Natal pra você e seus leitores.

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  2. savio Says:

    Muito interessante este artigo. Ha duas decadas venho acompanhando este fenomeno e diria que muitas mudancas ja ocorrerao. Uma vez em NY conheci um brasileiro muito distinto e certamente muito bem abonado, relacionado ao Banco Safra, e como o assunto chegou ao vinho, o qual eu sou ligado, eu o perguntei quais os vinhos brancos que ele gostava. Sua resposta me deixou um pouco triste e fez com que eu mudasse de assunto: “VInho Branco nao e’ vinho.”
    Em visita a familiares em Brasilia no final dos anos 80, la cheguei com a mala cheia de vinhos roses do Loire e Riesling Alemao (Trocken) para espanto de todos, nem uma garrafa de tinto. Hoje ja se apreciam roses e olha so’ o espaco ocupado pelos espumantes. O advento do Prosecco ainda continua abrindo mercado sertao-a-fora. Certamente vinhos industriais e de producao gigantesca.
    No verao sempre como uma salada com meu churrasco de carne vermelha e na minha salada sempre uso muito vinagre/suco de limao e sempre acompanho `a carne algum tipo de pimenta picante como o jalapeno ou pimenta chinesa. Bem acido e pimenta picante normalmente anulam o poder do paladar de apreciar a maioria dos vinhos porem existem alguns que harmnonizam com estes elementos e os complementam: Riesling Spatlese Feinherb do Rheingau, Nahe ou Palz. O Spatlese tem corpo para harmonizar com a carne grelhada e seu teor de acido (6.5 a 9 g/l) e residual de acucar (no caso do Feinherb: 10 a 15 g/l) harmonizam com os acidos e pimentas picantes da salada.
    Estes mesmos vinhos sao os vinhos ideais para uma feijoada debaixo de uma temperatura de 30 C+, pelos mesmos motivos, acido, acucar e corpo.
    O uso do vinho ainda e’ muito recente na cultura Brasileira e secundo o que aconteceu comigo mesmo ha trinta anos quando fui introduzido ao mundo dos vinhos, eu so queria tomar Bordeaux, Ribeira del Duero e Brunello. Hoje eu nao lembro a ultima vez que abri um Bordeaux para comsumo proprio. No inicio o paladar e’ como um bebe querendo dar seus primeiros passos e para tal pede forca, musculo e corpo, vinhos gordos pesados, muita extracao, muita madeira, etc. Aos poucos a conscientizacao comeca a dar lugar a elegancia, harmonia, graca. Esta conscientizacao acontece como se passa de crianca para adulto, uns sao precoces e outros jamais ocorre.
    Um dia o Brasileiro descobrira’ o prazer dos com alto teor de acido natural tanto nos brancos como nos tintos e os Malbecs da vida darao lugar a tais castas como o Gamay da Borgogna ou Loire. Dolcetto, Barbera e Grignolino do Piedmonte. Trousseau e Poulsard do Jura. Dornfelder da Alemanha. Zweigelt, Blaufrankisch e St Laurent da Austria. O proprio vinho verde tinto, sao otimos vinhos para serem apreciados frios e com baixo teor de alcool.
    E os Brancos? daria para escrever um livro de tantos que seriam perfeitos para o dia-a-dia das diversas zonas climaticas brasileiras. E para tal estou me referindo a vinhos medios, sem tocar nas regioes de fama por precos altos, e sim a vinhos que poderiam ser vendidos no Brasil entre 30 e 80 reais.
    O que se ve no Brasil sao importadoras trabalhando com muitos “necociants” e/ou importando muitos vinhos famosos com grandes rotulos, isto e’, em se tratando de vinhos Europeus de regioes frias o que da um perfil refrescannte ao vinho, por precos accessiveis, pouco se ve.
    Muito, mas muito mesmo ainda existe no universo do vinho que ainda nao e’ do conhecimento de various dos “wine experts” do pais, o que nos da a delicia de saber que muito ainda existe para ser descoberto.
    O vinho Branco ainda tera sua vez e eu acredito que nao sera necessario um Paulo de Tarso para levar esta boa nova `a mesa brasileira.
    Zum Wohl!

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